Sejam bem vindos ao "Psicanálise e afins". Este blog é diretamente relacionado com a página www.psicanaliseeafins.com.br do professor Roberto Mendonça.Visite-nos lá também.
Comentei no post sobre a nota de
rodapé do Esquema R, que a faixa do Real é para Lacan um Banda de Möbius (ou
escrito de um jeito mais aportuguesado, Moebius). Para entender bem essa figura
unilateral (!!!) que tem o nome de um matemático (August Ferdinand Möbius), mas
foi criada por outro (Johann Benedict Listing) vale a pena ver os vídeos do
psicanalista M.D. Magno que apresento abaixo (este é o link da primeira parte apenas). Agora, o ponto mais importante é
o seguinte: para se aprender topologia temos que botar a mão na massa. Peguem suas
folhas de papel, caneta, régua, tesoura, cola e tudo mais o que for preciso. Façam
tudo o que é apresentado no vídeo. Vejam por si mesmos. Aí vocês começarão a
entender a ideia lacaniana da mostração.
Como disse anteriormente, vamos falar um pouco
da nota de rodapé incluída por Lacan em 1966 ao texto De uma questão preliminar e que aparece na página 559 da edição
brasileira dos Escritos. Bem, esta é
uma longa nota que só termina na página seguinte. Um dos pontos mais
importantes dessa nota é que nela Lacan afirma que a faixa do Real,
representada pelo quadrilátero MImi é uma Banda de Möbius (falaremos dela em
outro post mais adiante) e isso torna o Esquema R uma figura bastante estranha.
Na verdade ele é um cross-cap (falaremos dele também mais adiante). É impossível
fazer um cross-cap em três dimensões. São necessárias 4!!! Estranho, não é? De toda
forma deixo um vídeo que enviei para um amigo meu do doutorado com uma
aproximação do que seria a ideia proposta por Lacan nessa nota. Vejam que tomo
o Esquema R e faço a torção da faixa do Real para fazer dela uma Banda de
Möbius. O vídeo é bastante improvisado, feito com o celular, e a figura também é
algo de muito rudimentar, mas já dá pra ter uma boa ideia.
Seguindo nossas conversas sobre a
realidade e a topologia de Lacan, pensei hoje em colocar alguns pontos sobre o
Esquema R, que se encontra no texto De
uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose, escrito na
virada de 1957 para 1958. Esta data é um ponto interessante pois esse texto se
refere ao Seminário 3 – as psicoses,
que é de 1955-1956. Vemos portanto que a construção do referido esquema
acontece simultaneamente com o Seminário 5 - as formações do inconsciente. Há ainda outra data interessante: a da nota de
rodapé acrescentada na página 559 da versão brasileira dos Escritos, onde aparece pela primeira vez tal esquema. É uma nota de
1966, portanto 10 anos posterior ao seminário das psicoses, contemporânea ao Seminário 13 – o objeto da psicanálise
(inédito em português). Falaremos dessa nota em outro post, no momento cabe
lembrar que o Esquema R é o esquema da realidade, uma primeira apresentação
gráfica do Real, do Simbólico e do Imaginário, acrescido de vários outros
elementos. Alguns autores dizem que ele é o Esquema L (que também é apresentado
no De uma questão preliminar), uma
representação gráfica do Estádio do Espelho, acrescida do Édipo. Todos conhecem
todos os matemas incluídos nesse esquema?
No momento estou assistindo (novamente) o pequeno curso de
cerca de 9hs do psicanalista argentino Alfredo Eidelsztein chamado A Topologia
na Clínica Psicanalítica de Jacques Lacan. Este curso foi proferido na USP e
tem como anfitrião o professor Christian Ingo Lenz Dunker. São três partes
disponibilizadas no YouTube. Vale muito a pena ver. O curso é apresentado em
espanhol, mas Eidelsztein fala bem lentamente, o que permite uma compreensão
fácil, mesmo pra quem não fala espanhol. O professor Eidelsztein tem várias publicações, dentre elas Modelos,
esquemas y grafos en la enseñanza de Lacan e La topología en la clinica
psicoanalitica. São todas leituras que valem a pena.
O filme sobre o jurista louco que talvez tenha feito a maior biografia da loucura, vista de dentro. Há alguns pontos que podem ser questionados no filme, por exemplo, o fato de que em momento algum se apresenta o ponto central do delírio de Schreber: tornar-se a mulher de Deus. É como se fosse um tipo de censura velada. De toda forma vale a pena assistir.
Há uma outra versão em filme do livro de Schreber, o filme Shock, head, soul, maseste infelizmente só podemos ver alguns trechos na internet.
abraços a todos e boa sessão de cinema.
Esta
é uma proposta de trabalho para o 9º Congresso Norte-Nordeste de Psicologia que
ocorrerá em Salvador – BA, e apresenta o início de teorização de minha tese de
doutorado sobre a realidade em psicanálise, buscando abordar a dualidade
dentro/fora através da topologia lacaniana. Trataremos do início da teorização,
uma interseção entre psicanálise e filosofia. Muito se sabe das aproximações
freudianas da filosofia de Kant. Na maioria dos textos encontramos críticas aos
erros de leitura e falta de domínio conceitual, e há também a proposta de que a
leitura freudiana de Kant seria enviesada pelas ideias de Schopenhauer.
Conhecendo tais avisos, mas deixando-os no horizonte de nosso estudo,
pretendemos abordar a origem do aparelho psíquico proposto por Freud e
aproximá-lo da estética transcendental de Kant baseando-nos para isto em dois
pequenos textos: o trecho kantiano relativo à Estética Transcendental incluído na Crítica da Razão Pura e o texto freudiano A negação (Die Verneinung), sempre tendo como foco principal a
psicanálise. A leitura cuidadosa desses dois textos, em diferentes traduções,
incluindo o original alemão, nos levam a encontrar relações significantes entre
as teorizações kantianas de espaço e tempo (formas a priori da sensibilidade) e os mundos interno (Innenwelt) e externo (Aussenwelt) de Freud, que apresentam a
dualidade da realidade em psicanálise – psíquica e material. Em Kant o espaço
seria a forma do sentido exterior, a maneira pela qual podemos representar os
objetos que existem fora de nós. O tempo seria o sentido íntimo, maneira pela
qual poderíamos perceber a nós mesmos intuitivamente, ou seja, nossos estados
internos. No texto freudiano podemos ler que em um momento infinitesimal menor,
um marco zero da subjetividade, haveria um divisor de águas no que se refere às
estruturas. Esse é o momento da afirmação (Bejahung)
e da expulsão (Austoβung). Em uma
perspectiva lacaniana podemos dizer que na neurose há a afirmação da lei
(Nome-do-Pai) e a expulsão do objeto, enquanto na psicose haveria a afirmação
do objeto e a foraclusão do Nome-do-Pai. Em ambas as estruturas o que se
criaria é uma separação entre um mundo interno, subjetivo; e um externo,
objetivo. A teorização freudiana das diferenças radicais entre neurose e
psicose em relação ao dentro e fora se deu por volta de 1924 no texto A perda da realidade na neurose e na psicose.
A hipótese atual de solução para a dualidade se encontra em um rascunho
freudiano no qual ele afirma que o espaço pode ser a projeção do aparelho psíquico,
havendo uma junção do dentro e do fora.
Quem é de Divinópolis certamente
já ouviu falar do Carrapateiro, a mais famosa cracolândia da cidade. Costumamos
ver reportagens sobre intervenções feitas no local em jornais de toda mídia. Entretanto,
pensamos que outro olhar pode ser possível. Por isso, em conjunto com outros
professores da UEMG Divinópolis, de diferentes cursos, projetamos uma proposta
de intervenção no local. A primeira fase está em processo de aprovação nos
órgãos responsáveis da UEMG, e caso seja aprovada constará de um reconhecimento
do local, que é uma área de preservação permanente (APP), além do conhecimento
dos moradores do local e de seu entorno. A partir disso pensaremos em propostas
para a segunda fase do projeto.
Está em fase de preparação um
curso de introdução à topologia lacaniana que provavelmente ocorrerá ao longo
do ano na UFMG, quinzenalmente. Tal curso será ministrado por mim em parceria
com minha orientadora Andrea Guerra. O curso
terá três módulos, um introdutório, com um pouco da história da geometria à
topologia, introdução aos principais conceitos e apreciações sobre a relação de
Lacan com a matemática. O segundo módulo tratará inicialmente dos três esquemas
apresentados no texto De uma questão
preliminar (os Esquema L, R e I) e depois passará às figuras da topologia
de superfície: toro (torus), banda de Möbius, garrafa de Klein e cross-cap. Por
fim, no terceiro módulo trataremos dos nós, cadeias e tranças, passando de uma introdução
à teoria dos nós, pelo nó borromeano de 3 e 4 elos, e também pelas discussões
acerca das estruturas clínicas (neurose e psicose) a partir da leitura
borromeana. Tudo isso será feito com muita mão na massa, não apenas teoria e
desenhos, mas com apresentação das figuras (mostração, como dizia Lacan) e
trabalhos com os nós.
Este grupo de pesquisa utilizará como método a leitura
comentada dos textos freudianos, buscando várias traduções e também o original
freudiano, em alemão. A intenção não é uma retradução da obra freudiana, mas o
estudo sistemático dos conceitos fundamentais da psicanálise.
A proposta é de um grupo de pesquisa que não se encerre em
um ano, mas que se renove constantemente, a cada ano, escolhendo novos
conceitos e novos alunos. A cada ano será eleito um conceito para investigação
exaustiva dentro da obra de Freud e, de início, o primeiro dos conceitos será o
de Inconsciente. Os trabalhos resultantes deverão ser endereçados ao grande
público, através de publicações em periódicos ou apresentação em congressos de
áreas afins. Toda a produção seria arquivada para que outros alunos, de todo o
Brasil possam acessar os caminhos da pesquisa. Toda a produção será postada
aqui neste blog para o acompanhamento do percurso da produção.
O grupo de pesquisa não ultrapassará o número de quatro
alunos mais o orientador, sendo que os alunos seriam novamente selecionados a
cada ano, sempre tendo como pré-requisito, estar cursando ou ter cursado as
disciplinas de Abordagem Psicanalítica I e II do curso de Psicologia da UEMG,
Campus de Divinópolis, ou seja, devem ser alunos que estejam matriculados entre
o sexto e o décimo período (por questões de periodização, e de adequação ao
projeto, os alunos devem estar cursando períodos impares – sétimo ou nono –
para que a pesquisa se encerre no oitavo ou no décimo períodos). Os encontros de
leitura podem ocorrer de forma presencial, em horário e local previamente
agendado dependendo da disponibilidade dos membros do grupo, e também virtual,
através de ferramentas disponíveis na internet. Também é possível a
participação de outros alunos interessados, enquanto ouvintes, às reuniões do
grupo.
Nossa visão do mundo através dos tempos sempre esteve
enviesada por dicotomias: ideias e coisas, sensação e razão, dentro e fora,
sujeito e objeto, res extensa e res cogitans, o psíquico e o material e tantas
outras.
Em alguns momentos tais dicotomias foram suspensas, ou
alguém tentou de alguma forma encontrar um meio termo entre elas, ou talvez uma
relação, um intermediário enfim. Com Platão a intermediário entre o mundo das
Coisas e o mundo das Ideias pode ser o número (pelo menos segundo Rey Pastor e
Babini em sua História da matemática); Kant diz que o fenômeno não se encontra
no objeto em si mesmo, nem no sujeito, mas na relação entre o objeto e o
sujeito.
Na psicanálise não é muito diferente. Freud sempre colocou essa
dicotomia em seus textos: realidade psíquica e realidade material (em alguns
momentos objetiva, em outros momentos realidade do mundo externo). A dicotomia
dentro fora aparece forte na distinção entre neurose e psicose em textos do
início da segunda tópica como Neurose e psicose e A perda da realidade na
neurose e psicose, nos quais Freud fala que a neurose é resultado de conflito
entre o Eu e o Isso em favor do mundo externo; já a psicose seria um conflito
análogo entre o Eu e o mundo externo a serviço do Isso.
Entretanto bem ao fim de sua vida, em um pequeno rascunho de
difícil leitura, Freud diz que “o espaço pode ser a projeção da extensão do
aparelho psíquico. Nenhuma outra derivação é provável. Em vez dos determinantes
a priori, de Kant, de nosso aparelho psíquico. A psique é estendida; nada sabe
a respeito”.
Partindo então da questão freudiana de que mais importante
que a perda da realidade é o estudo de sua construção, propusemos uma pesquisa
sobre a construção da realidade tendo como grande campo epistemológico a
Psicanálise. O método será a topologia lacaniana, pois acreditamos que as
figuras topológicas que Lacan estuda podem ser de grande utilidade para o
entendimento da realidade.
Essa pesquisa é realizada dentro da linha de pesquisa de
Estudo psicanalíticos do Doutorado em Psicologia da UFMG, sob a orientação da
conhecida e respeitada Andréa Máris Campos Guerra. Também tenho outros
parceiros nessa busca, entre os quais posso citar o grupo de estudos de
topologia do Aleph Escola de Psicanálise, em especial Maria Augusta Friche, e
ao professor Pablo Amster da Universidade de Buenos aires. A estas pessoas só
tenho que agradecer pela ajuda sincera.
Por enquanto é isso. Ao longo da escrita da tese irei
apresentando os principais pontos discutidos.
Deixo hoje um artigo em
parceria com meu amigo Carlos Eduardo Rodrigues publicado nos Cadernos
Brasileiros de Saúde Mental, em um número comemorativo dos 50 anos da primeira
edição da “História da loucura” de Foucault. Neste artigo são discutidos temas
relativos à internação de usuários de crack dentro de nossa realidade atual: a
Luta Antimanicomial, a Reforma Psiquiátrica Brasileira dentre outros pontos.