quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Euclides e os Elementos



Olá todos,
Como um livro escrito há cerca de 2300 anos pode nos ser útil para entender a clínica de Lacan? Isso até pode parecer estranho mas é bastante óbvio. Um primeiro conhecimento sobre a geometria, que se apresentava anteriormente de maneira difusa, foi compilado e organizado de maneira bastante clara por um pensador por volta de 300 a.C. Esse pensador foi Euclides em sua obra foi denominada Elementos. Pouco se sabe realmente sobre Euclides, mas seus escritos resistiram ao tempo e são, depois da Bíblia, o livro mais editado e vendido do ocidente.
Para mostrar o que dissemos ser óbvio, vejamos algumas definições de Euclides que muito nos ajudarão a entender a topologia. Escolheremos algumas bem simples, mas que são de suma importância para nosso desenvolvimento: ponto, reta e plano, ainda que não utilizemos exatamente as palavras de Euclides.
1.      Ponto: um ponto é aquilo que não tem partes.
2.      Reta: é o que tem comprimento, mas não possui largura.
3.      Plano: é o que tem comprimento e largura mas não tem espessura.
Partindo dessas definições tentemos então entender alguns conceitos básicos da geometria euclidiana. Se o ponto não tem partes, como poderíamos representa-lo? Assim como está entre os parênteses ( . )? Pode até ser uma boa representação, mas se utilizarmos uma ferramenta de zoom veremos que ele está assim ( ● ) e convenhamos que este ponto pode ser dividido em várias partes. Temos então que lembrar dos ensinamentos de Platão sobre o mundo das coisas e o mundo das ideias. Esse ponto representado em nossa folha de papel está no mundo das coisas, não é o ponto mesmo. Ele só é possível no mundo das ideias, para ficar mais fácil de entender, somente como abstração.
Se o ponto não tem partes, podemos também dizer que ele não tem extensão, ou seja, ele tem a dimensão zero (zero de altura, zero de largura e zero de profundidade) o que nos deixa frente a uma coisa bastante estranha (existiria algo com dimensão zero?).
Passemos para a reta. Poderíamos representar uma reta como vemos entre os parênteses ( — ), mas nossa ferramenta de zoom poderia nos fazer ver que ela poderia ser assim ( ▬ ), ou seja, ela seria um pouco grossa, tendo largura e altura. Mas se ela tem apenas comprimento, ela tem dimensão 1 (zero de altura, 1 de largura e zero de profundidade). Lembremos que esse 1 pode ser qualquer número entre o zero e o infinito. A reta então é o caminho que o ponto percorre no espaço, mas esse caminho poderia ser curvo, por isso precisamos de outra definição, a do plano.
O plano, como já podemos prever, tem dimensão 2 (1 de altura, 1 de largura e zero de profundidade). Então ele é como uma folha de papel? Não exatamente, pois se usarmos nossa ferramenta de zoom novamente veremos que a folha tem espessura. Basta lembrarmos da diferença entre essa nossa folha de caderno e uma folha de cartolina. A segunda é claramente mais espessa (tem maior profundidade). É com o plano que temos a noção de superfície que tanto nos será útil em nossos futuros empreendimentos (a topologia de superfície).
Para entender bem o que é o plano, ou mesmo a superfície, tomemos como exemplo a superfície do mar. Imaginemos o mar em absoluta calmaria, sem nenhuma onda. Ele seria um plano enorme. Caso desejemos mergulhar no mar, em qual momento estaremos na superfície? A resposta é estranha, mas em nenhum momento estaremos na superfície. Nós a cruzaremos, mas sem nunca estar nela, pois a superfície é o que separa o mar do ar. Essa separação não tem profundidade. Tem largura e altura, mas não tem profundidade. Durante o período em que estamos cruzando a superfície, seja mergulhando ou voltando do mergulho sempre estaremos parte na água e parte no ar. É que nosso corpo tem dimensão 3 (1 de altura, 1 de largura e 1 de profundidade) o que não nos permite entrar na superfície, apenas deslizar sobre ela, como um patinador desliza sobre a superfície do gelo.
Essas definições são de extrema importância para que quer entender as superfícies utilizadas por Lacan ao longo de seu ensino. Para isso deixo uma pergunta: como a banda de Möbius pode ser uma superfície unilateral (sem direito e avesso)?
Abraços,

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Um exemplo de leitura topológica do texto freudiano

Olá todos,
Vamos hoje dar um exemplo de leitura topológica de um texto freudiano. esta leitura é feita por Alfredo Eidelsztein, mas aqui eu mesmo inseri algumas figuras para deixar o exemplo mais claro.
Este exemplo é retirado do A interpretação dos Sonhos de Freud. Vejamos no desenho abaixo:



Esta é a versão final da proposta freudiana. Há outros esquemas anteriores. Vejamos o que ele nos diz. Em primeiro lugar, a esquema funciona caminhando da esquerda para a direita. Podemos notar que primeiro nosso aparelho psíquico tem uma percepção de alguma coisa, esta percepção deixa rastros de memória (que são marcados aqui como Mnem, Menem’). Mais ao fim temos o Inconsciente, depois o Pré-consciente e por fim a descarga motora, onde podemos colocar a consciência. Este é o esquema do sistema percepção-consciência freudiano.
Agora imaginemos tudo isso em uma linha, na qual cada uma das etapas é um ponto. Podemos fazer uma torção nessa linha e transformá-la em uma espiral. Vejamos no desenho abaixo:




Nesta transformação topológica podemos notar que os pontos mantêm suas posições, e que a cada ponto da linha reta, temos um único ponto na espiral. Tomemos como exemplo o Pcs. Ele está entre o Ics e o Cs. Vejamos que na espiral esta localização se mantém. Esse esquema nos mostra que uma representação inconsciente não passa diretamente à consciência. Ela necessita antes chegar ao pré-consciente. Ou seja, os pontos precisam manter sua posição no espaço para que o esquema funcione.
Vemos então que o conceito de biunivocidade (a cada ponto da reta corresponde apenas um ponto da espiral e vice versa) se mantém, assim como o conceito de bicontinuidade (dois pontos vizinhos na reta correspondem a dois pontos vizinhos na espiral). O esquema funciona porque todos os pontos são considerados conjuntos abertos. Se eles fossem fechados uma suposta energia que os atravessa pararia no ponto que fosse um conjunto fechado. Temos então nesse exemplo a utilização dos conceitos de aberto, vizinhança, continuidade e transformação topológica ou homeomorfismo.
Mas e se fizéssemos outra transformação e a linha se tornasse uma circunferência, unindo os pontos Pcpt e Cs? Vejamos no desenho:


Notemos que alguns pontos mantém a vizinhança, como vimos no exemplo anterior analisando o ponto Pcs. Entretanto os pontos Pcpt e Cs se tornaram um só e assim o fim e o início do esquema estão no mesmo lugar. Se fizermos uma analogia com um circuito elétrico teríamos um curto-circuito e talvez os traços de memória, o inconsciente e o pré-consciente não fossem mais necessários. Estaríamos aqui no reino da psicologia? Podemos notar então que esta não é uma transformação topológica, ou seja, o esquema percepção-consciência de Freud não é homeomorfo de uma circunferência, pois as propriedades dos lugares não se mantêm.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Informações sobre o curso de topologia: Quer que eu desenhe?

Olá todos,
já estão disponíveis na página http://www.psicanaliseeafins.com.br/topologia2.html as informações sobre o curso de introdução à topologia lacaniana Quer que eu desenhe? que será ministrado na UFMG a partir de março de 2015.
As inscrições já estão abertas.
Abraços,

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Programa do curso "Quer que eu desenhe?" Uma introdução à topologia lacaniana

Já está no ar, no site http://www.psicanaliseeafins.com.br/topologia.html, o programa e cronograma do curso de topologia "Quer que eu desenhe?" que será oferecido na UFMG a partir de março próximo. O curso será ministrado por mim e terá a coordenação de Andréa M C Guerra.


quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Curso de topologia na UFMG

Olá todos,
nesta semana tive um encontro com minha orientadora Andrea Guerra para finalizarmos a proposta do curso de topologia lacaniana na UFMG. A princípio já está tudo ok (material didático, programa, conteúdo, forma do curso, etc). agora só falta a aprovação oficial da UFMG, o que, devido a conversas prévias com a coordenação da pós-graduação em psicologia de lá, não vai ser empecilho. A data de início também já está marcada: dia 13/03.
Dentro em breve deixarei no site www.psicanaliseeafins.com.br o programa do curso assim como as principais instruções para a inscrição dos interessados.
abraços a todos,

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Uma visita topológica com Pablo Amster

Olá todos,
Depois de algum tempo viajando passo novamente para falar de topologia. Desta vez muito mais para falar sobre a quantas anda o meu estudo de topologia. Passei uma ótima tarde no dia 27/01 com o professor Pablo Amster, diretor do departamento de matemática da Universidade de Buenos Aires (UBA). Fizemos uma bela excursão por diversas livrarias da cidade para buscar alguns livros que eu não tinha e também para colocar em dia os caminhos da pesquisa, já que a topologia é o grande foco. Aproveitamos para passar por alguns lugares pitorescos como a casa de Carlos Gardel e alguns bairros mais tradicionais de Buenos Aires – uma cidade linda.
O que fica de bom desse encontro: mais uma vez falar da incrível disponibilidade do professor Pablo Amster (era interessante que, nas livrarias, os vendedores que não o conheciam nos indicavam seus livros, e ele ficava super sem graça) e também a novidade de que há uma provável vinda sua para a continuação de seu curso de topologia no Aleph Escola de Psicanálise em BH, e em breve, talvez setembro, a publicação de dois de seus livros (Apuntes matemáticos para leer a Lacan, vols 1 e 2) traduzidos para o português, em São Paulo.

No mais abraços a todos,