quinta-feira, 12 de abril de 2012

O analista só se autoriza de si mesmo, não por si mesmo


Olá todos, ultimamente tenho visto muitas pessoas por aí que se intitulam psicanalistas. Isto é um fato interessante, pois como a psicanálise não é uma graduação de uma universidade, fica fácil alguém dizer que é analista, pois não precisa de um “diploma”. Entretanto há uma formação, grande, demorada, séria e que é baseada no tripé da formação: estudos, análise e supervisão dos atendimentos. Depois de um longo percurso, há o passe, nas escolas de orientação lacaniana.

Podemos citar escolas serias como a EBP, O Círculo psicanalítico, o Aleph e tantas outras, mas vemos muitas instituições que se denominam escolas de psicanálise chegando a dar “Carteirinha de psicanalista”.

Outro ponto são alunos de graduação, recém formados que se intitulam psicanalistas, ou mesmo pessoas que fazem alguma especialização, ou mesmo cursos de extensão em teoria psicanalítica e acham que isto é ser psicanalista.

Não é bem assim. Ao procurarem algum analista, sejam atenciosos. Perguntem onde ele fez sua formação.

Cuidado a picaretagem existe nos lugares mais improváveis.


Só para complementar, deixo o trecho do texto de Lacan no qual ele fala que “O analista se autoriza de si mesmo” e depois um comentário de Antonio Quinet. Vale a pena ler e refletir.



Abraços a todos,


“O analista só se autoriza de si mesmo*, isso é óbvio. Pouco lhe importa uma garantia que minha escola lhe dê, provavelmente com a irônica sigla AME. Não é com isso que ele opera.

[...]

Aquilo de que ele tem de cuidar é que, a autorizar-se de si mesmo, haja apenas o analista.

Pois minha tese, inaugural ao romper com a prática mediante a qual pretensas Sociedades fazem da análise uma agregação, nem por isso implica que qualquer um seja analista.

Pois, no que ela enuncia que é do analista que se trata, supõe que ele exista.

Autorizar-se não é auto-ri(tuali)zar-se.

Pois afirmei, por outro lado, que é do não-todo que depende o analista.

Não-todo ser falante pode autorizar-se a produzir um  analista. Prova disso é que a análise é necessária para tanto, mas não é suficiente.

Somente o analista, ou seja, não qualquer um, autoriza-se apenas de si mesmo.

Existem analistas, agora está feito: mas é por isso que eles funcionam. Esta função apenas torna provável a ex-sistência do analista. Probabilidade suficiente para garantir que haja analista: que as chances sejam grandes para cada um, deixa-as absolutamente insuficientes”



* Optamos por um português não usual na tradução deste aforismo (“...por si mesmo), pois é importante ressaltar que, ao utilizar a preposição de em lugar de par, Lacan reduz a possibilidade de uma leitura direta desta autorização como auto-autorização.



(Lacan, Nota Italiana, Outros Escritos, Zahar, 2003, pp. 311-312)



Em 1974, Lacan dirige a um grupo de três italianos a proposta de constituírem uma Escola nomeando como membros “aqueles que aí postularem sua entrada com base no princípio do passe”. Nesse texto, ele enquadra de outra maneira seu aforismo “o analista se autoriza por si mesmo”, afirmando que isso “não implica que qualquer um seja analista, pois autorizar-se não é ‘autorri(tuali)zar-se’ e que não é todo ser falante que pode se autorizar a bancar o analista”. Daí sua proposta de constituição de uma Escola pela via da verificação dessa autoautorização do analista pelo dispositivo do passe. Em suma, a proposição de 1974 de Lacan era de uma Escola de AE, em que o recrutamento fosse efetuado pelo passe, projeto que jamais foi realizado, mas deixa a indicação de que a autoautorização do analista em praticar a psicanálise não dispensa a verificação — que pode ser feita no dispositivo do passe.



(Antonio Quinet, A estranheza da psicanálise, Zahar, 2009, p. 63.)